Entrevista
ALGUMAS AGÊNCIAS SAIRÃO MAIS FORTES
Publicado emCopresidente da Africa fala sobre criação durante a pandemia e sua visão sobre o futuro do mercado
Sergio Gordilho, copresidente da agência Africa com Márcio Santoro desde 2010, atende entre outras marcas, Itaú, Brahma, Vivo, Natura, Budweiser, Mitsubishi, Sadia, BR, P&G, Marisa e Folha de S.Paulo.
E para a maioria delas criou, com sua equipe, campanhas durante a pandemia, descobrindo fórmulas e caminhos para que a comunicação dos clientes com o público não parasse durante a quarentena.
Como ele diz nesta entrevista, desafios e criatividade sempre caminharam juntos. Todo criativo é movido a desafios.
“Colocando de lado o negativismo que vivemos como consequência da Covid-19 e do isolamento social, esse é um momento em que a criatividade tende a florescer. Uma criatividade autêntica, relevante e com propósito, como o próprio momento pede”, afirma.
Além de copresidente da Africa, Gordilho é diretor geral de criação e sócio do grupo ABC, maior holding de comunicação da América Latina, integrante da holding multinacional Omnicom.
Baiano de Salvador, formado em arquitetura pela Universidade Federal da Bahia, ele é pós-graduado em Design Gráfico pelo Royal College of Art, de Londres, e tem Mestrado em Administração de Negócios pela Berlin School of Creative Leadership.
Ainda na capital baiana, trabalhou na Propeg e SLAP. Após estudos em Londres, chegou a São Paulo em 1999 para atuar na DM9 DDB. Entre 2000 a 2002, trabalhou na agência Bates Brasil, atual Y&R. Em dezembro de 2002 participou da fundação da Africa com Nizan Guanaes, Marcio Santoro, Luiz Fernando Vieira e Olivia Machado.
BLOG- De que forma a agência integra sua equipe com os profissionais em home office?
GORDILHO- Como em qualquer situação extrema, o simples ato de ser obrigado a mudar seus hábitos e processos traz perdas e ganhos. Sobre os processos, estamos tendo a divina chance de repensá-los. Os hábitos, a chance de questioná-los.
Existiam muitos mitos no processo criativo que hoje estão se mostrando mais “Mintos”. Principalmente no que se refere a criar um ambiente propício à criatividade. ter todo mundo junto o tempo todo e por todo o tempo era o padrão mandatório da nossa indústria. Muita gente, muita dispersão.
Era tentar vender uma ideia no meio de uma multidão. Processos e hábitos antiquados para se gerar criatividade moderna. Haja ambiguidade. Por isso, vivíamos a ditadura da transpiração sobre a inspiração. Quanto mais melhor, e não só o melhor. A indústria acreditava nisso. A distância nos provou o contrário, impossibilitou as reuniões longas, com excesso de pessoas.
Agora elas são curtas, mais vazias e quase sempre conclusivas. Só está quem tem o que acrescentar. Ganhamos foco. E o foco muda tudo. Faz a gente ser mais assertivo. Ser mais eficiente. Ganhar tempo. E assim redescobrimos que é o tempo que mais nos fazia falta, e o que nos faz ser mais criativos.
BLOG- Campanhas convencionais foram substituídas por mensagens sobre coronavírus?
GORDILHO- Depende. A experiência nos mostra que as marcas precisam atualizar sua comunicação de acordo com o momento que vivemos. Precisam ser mais solidárias, mais informativas. Vivemos o maior desafio pós 2º Grande Guerra.
Marcas não podem viver em bolhas. Fazer de conta que nada está acontecendo. Elas não podem ser oportunistas, mas também não podem deixar de estar ao lado das pessoas. Pessoas antes de seres consumidores. Pois se não há consumo. Não há consumidor. Se não há consumidor, não há negócio.
Simples assim. O negócio agora é outro. A marca tem que alinhar a comunicação de seu propósito às necessidades da sociedade atual, senão vai ser cobrada ali na esquina.
E por isso vemos lindas campanhas e marcas corajosas liderarem este momento. Ambev, Itaú, Natura, Vivo e Magazine Luiza são algumas delas.
Mas esse é o momento que vivemos. Possivelmente vai mudar. E uma nova normalidade vai se apresentar. Com campanhas mais alinhadas às novas reais necessidades do novo mundo que irá surgir. E aí a publicidade vai voltar a nadar de braçada.
BLOG- Qual a participação dos clientes na manutenção do trabalho da agência?
GORDILHO- Nunca antes os clientes estiveram tão perto e tão próximos por tanto tempo. Com tantas incertezas, a única certeza que temos é que devemos navegar juntos. A relação voltou a ser mais horizontal. Em que todos os decision makers estão na mesma sala do ZOOM ou TEAMS.
Pois o que não dá para fazer é ficar parado, ou calado. Hoje, gastamos mais tempo em levar soluções do que fazendo keynotes. E isso muda tudo, pois não veiculamos apresentações.
Fizemos isso junto aos líderes da Ambev, das lives de sertanejo à produção de máscaras com a matéria-prima da garrafas PET de Guaraná Antarctica. Fizemos isso junto ao Itaú, do primeiro dia da doação de 1 bilhão do banco até o lançamento da “Todos Pela Saúde”. E com a Vivo na união das operadoras.
BLOG – Qual sua expectativa quanto ao futuro do mercado publicitário pós-pandemia?
GORDILHO- Acho que algumas agências vão sair mais fortes. Outras não. Seleção natural. Vai depender da verdade de cada uma. Pois nunca o talento foi tão necessário. E tinha muita agência que não tinha talento algum. Só preço.
Estávamos também deixando a ciência esconder a criatividade, nos escondendo atrás de dados que não nos levavam a nenhum lugar. A ciência tem que apoiar e vitaminar a criatividade na nossa indústria.
Os dados são o novo petróleo, mas sem o refinamento necessário eles não movem nada. O que move são ideias. E o poder da ideia estava em segundo plano. Por isso, tenho uma visão otimista. O mercado publicitário vai mais uma vez se reinventar.
Vai voltar a fazer o que está fazendo hoje: entregando criatividade. Ajudando a construir pontes entre marcas e consumidores. No momento que os dois mais precisam. Esse é o DNA da publicidade brasileira.